“Quanto mais me bates mais gosto de ti”
O que é violência psicológica?
A violência psicológica acontece de múltiplas formas. Enquanto algumas agressões podem passar despercebidas outras são mais evidentes, como chamar nomes desapropriados, humilhação e chantagem emocional.
Este tipo de violência possui a intenção de fragilizar o estado emocional e psicológico da vítima. O agressor psicológico recorre a várias artimanhas para deteriorar a sua saúde mental. Nos relacionamentos afetivos, é mais comum esses mecanismos serem usados friamente para deixar o cônjuge apegado ao agressor.
As ações violentas são comumente mascaradas como ciúme, excesso de cuidado, temperamento forte, desentendimentos, entre outras justificativas. O agressor psicológico tende a passar despercebido por longos períodos devido a essas interpretações erróneas.
Outra característica deste tipo de violência é o seu crescimento gradual. As agressões psicológicas vagarosamente minam a autoestima da vítima e confundem a sua perceção dos acontecimentos e da personalidade do agressor.
Elas começam como comentários e provocações sutis. À medida que a vítima “aceita” e passa a ouvir o agressor, elas se transformam em agressões sérias. Dessa maneira, a vítima é incitada a se colocar numa posição de submissão.
Formas de agressões psicológicas
As agressões psicológicas acontecem de variadas formas, podendo ser mais violentas ou mais sutis. Como a diversidade de ações violentas é grande, a vítima pode ficar confusa ao tentar identificar o que é problemático e o que é da personalidade do agressor.
Quando o agressor é o cônjuge, obter essa perceção é ainda mais complexo já que a vítima também nutre sentimentos bons por ele. Ela tem dificuldade para separar o que sente pelo agressor no momento do julgamento das agressões. Assim, leva mais tempo para chegar a uma conclusão concreta sobre o comportamento do parceiro.
Para esclarecer quais atitudes compõem a violência psicológica, reunimos uma série de agressões abaixo.
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Ameaças: o agressor psicológico ameaça terminar o relacionamento, ferir a vítima de alguma forma ou acabar com algo precioso para ela, como uma amizade ou uma oportunidade profissional;
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Humilhação: as humilhações podem ocorrer tanto em momentos íntimos, somente entre a vítima e o agressor, quanto em ambientes públicos. Alguns agressores têm prazer em diminuir as vítimas diante de amigos e familiares para se enaltecerem;
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Manipulação: o agressor manipula a vítima emocionalmente por meio de várias artimanhas, como chantagem emocional e distorção da realidade. Assim, ele consegue sempre deixar a vítima perto dele para sofrer mais agressões;
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Isolamento social: é comum a violência psicológica acontecer em paralelo com o isolamento da vítima de amigos e familiares para que ela não consiga identificar o que está errado na relação. Além disso, o agressor sente necessidade de controlar a vítima;
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Insultos: esta é a forma mais evidente de agressão psicológica. O agressor insulta a vida de várias maneiras desde pequenos comentários disfarçados de brincadeiras. Normalmente, o agressor faz a vítima se sentir burra e incapaz, colocando na cabeça dela que precisa dele para viver;
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Limitação de direitos: esta forma de violência também se estende ao controle dos direitos de ir e vir da vítima, bem como de se expressar e de interagir com quem ela deseja. O agressor faz de tudo para administrar a vida da vítima da forma como ele bem deseja;
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Ridicularização: semelhante à humilhação, a ridicularização tem a intenção de fazer a vítima se sentir inferior. É comum o agressor dizer que ela nunca encontrará alguém como ele porque somente ele aguenta a “estupidez/burrice/chatice” dela. Outra característica da ridicularização é a constância de críticas à aparência, personalidade, modo de falar, vestuário, entre outros;
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Distorcer fatos: a distorção de fatos, também conhecida como gaslighting, ocorre para deixar a vítima confusa sobre a realidade. O agressor distorce acontecimentos, conversas e memórias para implantar dúvidas na cabeça da vítima. Deste modo, ela passa a ver a perceção dele como certa sem considerar os seus próprios julgamentos.
Consequências da violência psicológica
À medida que as agressões psicológicas se repetem, a vítima ao mesmo tempo fica com medo do agressor e com autoestima baixa. A autoperceção negativa impede que ela termine a relação tóxica, seja esta romântica, profissional, familiar ou de amizade.
A vítima de violência psicológica começa a duvidar da sua própria capacidade de julgamento das situações e do seu merecimento da felicidade. O agressor psicológico comumente consegue fazer a cabeça dela, criando um laço de dependência difícil de ser quebrado.
Consequentemente, a vítima anula-se, diminui e se isola de pessoas queridas. Para não ser agredida repetidas vezes, ela cede às vontades do agressor e tenta criar uma convivência harmoniosa, mesmo que isso signifique sabotar a sua própria felicidade.
Outras esferas da vida da vítima também são afetadas. Ela deixa de trabalhar com afinco, de contatar amigos, de sair de casa (quando divide a moradia com o agressor, é comum que isso aconteça), de cuidar da saúde e da aparência, de fazer planos, entre outras.
A longo prazo, essa forma de violência também causa diversos transtornos mentais severos, como ansiedade, síndrome de pânico, stress pós-traumático e depressão.
Como o estado emocional da vítima é fragilizado a ponto de ela duvidar de seu próprio valor como pessoa, é muito difícil para ela deixar um relacionamento abusivo ou cortar relações com o agressor psicológico.
Quem está de fora pode não entender a sua decisão de ficar ao lado do perpetuador das agressões. É assim que surgem conceções erróneas acerca de relacionamentos doentios, tais como “ele/ela gosta de sofrer”. Na verdade, a vítima precisa de ajuda psicológica e apoio para se reerguer e conseguir deixar a situação desagradável.
O que fazer ao ser vítima de violência psicológica?
Vítimas de agressões psicológicas devem procurar o apoio de amigos e familiares para conseguir deixar o relacionamento abusivo. A orientação de um psicólogo também é extremamente útil para fortalecer autoestima e, consequentemente, cortar laços com o agressor.
A terapia também auxilia as vítimas de violência psicológica a compreenderem a natureza do seu relacionamento tóxico, reestruturarem as suas vidas a partir do fim da relação ou do distanciamento do agressor, e curarem as mágoas criadas durante a relação.
Como as agressões psicológicas têm como principal objetivo inferiorizar a vítima, é crucial trabalhar a autoestima, o amor próprio. Ainda assim, pode levar muito tempo para a vítima se sentir bem com ela mesma novamente.
O acompanhamento psicológico pode durar anos até que a vítima consiga deixar os momentos maus vivenciados ao lado do agressor para trás por completo. O medo e a vergonha são empecilhos comuns neste processo.
O que fazer para ajudar outra pessoa?
Se alguém próximo é vítima de agressões psicológicas, independente da natureza do relacionamento dela com o agressor, podemos primeiramente demonstrar apoio à vítima.
Como as vítimas costumam estar num estado fragilizado, essa pessoa pode ter medo ou vergonha de falar com amigos ou familiares sobre a violência. Sendo assim, clarifique que não está lá para fazer julgamentos acerca da situação dela.
Mostre quais os comportamentos do agressor, na verdade, formas de violência. Também pode incentivar a avaliar o seu próprio estado emocional e psicológico, bem como identificar os sentimentos que o agressor a faz sentir no dia a dia.
É importante que a vítima seja capaz de reconhecer esses elementos sozinha, por isso, sempre bom incentivar a reflexão em vez de fazer acusações.
Informe amigos e familiares da gravidade da situação, se não tiver um relacionamento muito íntimo com a vítima, é provável que eles tenham mais sucesso que.
Por fim, encoraje a vítima de violência psicológica a fazer terapia para cuidar de sua autoestima abalada e curar as suas dores emocionais.
Estatísticas
De acordo com estudos, cujos dados são relativos a 2020, 67% dos jovens consideram legítima a violência no namoro, dos quais 26% acham legítimo o controlo, 23% a perseguição, 19% a violência sexual, 15% a violência psicológica, 14% a violência através das redes sociais e 5% a violência física.
Quase sete em cada dez jovens que participaram num estudo sobre violência no namoro acha legítimo o controlo ou a perseguição na relação e quase 60% admitiram já ter sido vítimas de comportamentos violentos.
Os dados mostram que 58% de jovens que namoram ou já namoraram reportam já ter sofrido pelo menos uma forma de violência por parte de atual ou ex-companheiro/a; e 67% de jovens consideram como natural algum dos comportamentos de violência. O estudo aponta para a elevada prevalência e legitimação de formas específicas de violência como a violência psicológica, aquela exercida através das redes sociais ou as atitudes de controlo (sobre vestuário e hábitos de convívio, entre outros).
Quanto às principais causas apontadas para a existência de violência durante o namoro, os denunciantes destacaram o ciúme, em 70.8% das situações, problemas mentais da pessoa agressora (37%), o consumo de álcool ou de outras substâncias pelo agressor (22.5%) e os problemas familiares (19.5%). Também a conduta da vítima foi referida em 18% das queixas, seguida da influência dos amigos (14.1%) e as dificuldades económicas da pessoa agressora (9.9%).